[AMOSTRA] Vol. 2: "Le Soleil"
- Lorena Silva
- 13 de out. de 2021
- 23 min de leitura
Atualizado: 17 de out. de 2021

PRÓLOGO
A chave foi virada duas vezes na fechadura. A porta abriu-se lentamente. O interior do apartamento revelava um grande e silencioso vazio. No entanto, o perfume permanecia; o perfume que ele jamais confundiria, que entorpecia sua mente com efeito perpétuo: era o perfume dela.
Adrian entrou na sala como se sua presença ali fosse ofensiva, contando os passos, olhando em volta. Era doloroso entrar ali, depois de tudo que acontecera. Depois de tudo que a tirara de sua vida.
Enquanto atravessava a sala de estar, deparou-se com o grande espelho na parede e sentiu um frio em seu interior – sua imagem refletida mostrava que as últimas semanas o massacraram não só por dentro, mas também por fora: os cabelos castanhos, antes sempre penteados para trás, agora estavam desgrenhados, sem corte, mechas curtas que caíam sobre sua testa, sempre franzida. Seus olhos traziam olheiras que se aprofundavam a cada noite mal dormida, a boca formava uma linha convexa no rosto. Balançou a cabeça e o reflexo fez o mesmo. Deu as costas ao espelho e continuou a inspecionar o lugar.
Aquele apartamento era dele havia anos, mas nos últimos cinco, Seraphine, sua adorada Shelly, morara lá. Entrar ali outra vez após tanto tempo fazia sua cabeça girar, as cores vacilavam em borrões ao seu redor. Mas era suportável. Adrian pressentia que a qualquer momento entraria em colapso, desabaria, procurando respostas que não tinha. Entretanto, ele estivera adiando esse momento por vários dias e supunha que podia aguentar mais um pouco, só não sabia até quando.
Continuou a passos lentos em direção ao quarto. Hesitara em entrar ali, o golpe de memórias seria ainda maior. Ao tocar a porta entreaberta, por alguns segundos uma espécie de estática perpassou seus dedos, mas ele queria sentir alguma coisa, ainda que fosse a angústia de saber que ela o havia deixado para trás. E, assim que cruzou a porta do quarto em que ela dormira, sentiu que a qualquer momento ela poderia voltar, como se fosse aparecer naquela mesma porta acenando para ele. Adrian gostou daquela imagem, quis intensificá-la. Empurrou a porta e entrou.
O perfume era mais forte naquele cômodo, como esperava. Estava quase tudo ali. Percebera, não sem ofender-se, que Shelly deixara tudo que a ligara a ele naquele espaço: os livros que lhe dera todos empilhados na estante, os móveis que comprara – o guarda-roupa, a escrivaninha, a mesa de cabeceira – tudo carregava suas digitais. Havia uma tensão na nuca, como se estivesse a ponto de estalar, contudo, tinha que continuar, só possuía aquelas sensações cegas agora.
Ali estava a cama dela: as roupas de apresentação de Seashell estavam todas sobre a colcha empoeirada. Uma tristeza profunda foi espalhando-se por sua alma, cristalizando suas veias, tornando seu interior frio e estático. Ali estava a fonte do cheiro que perturbava todos os seus sentidos. Levaria consigo tudo aquilo, era só o que tinha, era o que restava. Um sorriso frouxo escapou de seus lábios pela primeira vez em muitos dias.
Mas além das roupas, deparou-se com algo que não esperava: havia um livro sobre a pilha de roupas, um livro de capa dura que não notara antes. Tomou-o nas mãos, sentando-se na cama, deixando o tecido de mais uma das fantasias escorrer por entre os dedos. Constatou que, afinal, não era um livro. Era uma agenda.
O coração de Adrian saltou até a garganta e ficou preso ali, pulsante. Aquilo era precioso, na verdade, inestimável. Estava dividido entre gargalhar e prender o fôlego. Havia um bilhete escrito: “Leia, Adrian”. Era para ele. Ela escrevera seu nome com sua caligrafia redonda e ele quase ouviu aquela voz pedir que, de fato, ele lesse.
Seus dedos trêmulos viraram a capa. Uma avalanche de palavras sussurradas encheu seus olhos e sua mente. Ela o descrevera com palavras carinhosas, revelara pensamentos, sentimentos que os olhos vorazes de Adrian mal conseguiam acompanhar. Estava tudo ali, desde o primeiro dia: as flores, os bilhetes, os sentimentos que ela escondia dele, que ela negava dividir, indo isolar-se como sempre fazia. Como ele detestava aquilo! E agora ela revelava tudo. Tudo que sempre quisera saber sobre as emoções que engaiolava gritando do papel para ele. Tudo que já houvera por trás daqueles olhos cor-de-mel que ele jamais conseguira decifrar agora estava ali em suas mãos, traduzido em frases curtas espalhadas por aquelas páginas.
Então era verdade, ela o amara. Amara... Não amava mais? O que isso significaria? Não... Por que ela iria querer que Adrian lesse tudo aquilo? Seraphine tinha sentimentos por ele, sentimentos fortes, legítimos. Estava tudo escrito ali. Enquanto ouvia a voz dela misturada a todo o caos em sua mente, o mundo havia parado para Adrian naquele minuto.
Ele precisava encontrar sua Shelly.
Capítulo 1
Bem-vindos a Green Valley
Ela olhava para o teto de gesso com pequenas infiltrações, exatamente como sua mente estava agora. As pequenas rachaduras formavam uma teia que descia pelos cantos e lembravam raízes sinistras, quase imperceptíveis, se Seraphine não fosse uma boa observadora.
Havia sido um longo caminho até ali, em vários sentidos. Ter deixado a cidade onde vivera por dez anos, trabalhando como dançarina em um clube noturno, voltando todas as noites de madrugada, fora um passo largo. Por um momento pensara que suas pernas não chegariam ao outro lado. Mas ali estava ela, cruzara a ponte, ou melhor, a rodovia que saía de Downville e lhe trazia, sete horas depois, a Green Valley.
O saguão de entrada do hotel, onde ficava a recepção, era pequeno e escuro, até mesmo um pouco úmido. Mas era a primeira vez em muito tempo que Seraphine se sentia livre. Sammy, seu gato de estimação, que por nada no mundo deixaria de trazer com ela, estava dentro de sua gaiola, já rabugento. O anúncio do hotel não dizia nada sobre animais, mas ela supôs que por apenas uma noite haveria uma exceção. Além do mais, Sammy sempre soubera se comportar muito bem, não se ouvia sequer um miado. O recepcionista estava ausente e, enquanto esperava, ficou pensativa olhando para os próprios pés.
A decisão de ter deixado tudo para trás (“ou quase tudo”, lembrou com amargura) fora abrupta, mas necessária. A vontade que ela sentia de ser a protagonista de sua própria história a venceu, e era daquela vontade que viveria daquele dia em diante. As últimas semanas haviam sido cruéis com Seraphine: em questão de horas tudo que acreditara ruíra sob seus pés. Sua vida inteira se baseara em uma grande série de meias-verdades e aquele que considerara seu melhor amigo, que a tirara de um orfanato após tantos anos de solidão; aquele que lhe dera um lar e um emprego; aquele que a ajudara a descobrir algo que amava fazer; aquele que por dez anos cuidara dela, a respeitara como funcionária, como amiga, como irmã; por fim mostrou que não era quem ela pensava.
Adrian ocultara dela uma verdade terrível sobre si mesmo. Ela não esperava que ele revelasse todos os detalhes mais sórdidos de sua vida para ela, afinal, ela mesma nunca fizera isso. Não o odiava, sequer conseguia pensar mal dele. Contudo, era muita coisa para suportar, fora apenas a gota d’água, o que precisava para resolver dar outro rumo para sua vida. E tudo isso talvez ainda fosse apenas um plano se Ian não tivesse aparecido.
As circunstâncias em que conhecera Ian foram tão adversas, parecia quase injusto. Os dois haviam sido bons vizinhos e por algum tempo, amigos. Mesmo que ele tenha tido seus próprios segredos, ele chegara no meio de uma história que já era complicada. Era um caso totalmente à parte para pensar, e nem sabia muito bem o que pensava realmente dele.
Desde que havia descoberto a verdade sobre Ian e seus planos ao se mudar para o apartamento ao lado do dela, a confiança que depositara nele nos primeiros contatos fora abalada. Mas havia algo em Ian que não permitia que Seraphine sustentasse qualquer sentimento ruim por ele, só conseguia sentir uma estranha gratidão. Talvez por ele tê-la ajudado a abrir os olhos, talvez por ele ter sido um escape da realidade para ela, ainda que por pouco tempo.
Sentira-se tão estranhamente feliz, aliás, por ele ter aparecido no mesmo ônibus que ela, com destino à mesma cidade. Parecia apenas coincidência demais. Era curioso o fato de Ian estar sempre aparecendo em seu caminho, mas ela não estava reclamando. A companhia dele, apesar dos pesares, lhe fazia bem.
Lembrou-se da conversa que tiveram pouco antes de descerem do ônibus, enquanto ele lia um de seus livros pesados e de capa amarelada:
– Já sabe onde vai ficar, quando chegar? – Ian perguntara.
Ela apenas assentiu com a cabeça.
– E suponho que não vai me dizer onde.
– É que... Vou precisar de um tempo. – Ela disse, hesitante.
– E você não me quer perturbando suas reflexões indo tomar café na sua nova casa.
– Não fale assim, você sabe que é bem-vindo.
Ian tinha se virado para ela. Os olhos muito claros sob toda aquela luz faziam dele uma aparição, uma criatura etérea. Os cabelos quase brancos, a pele alva, tudo refletia a luz. Na verdade, era bem perturbador.
– Eu sei. Eu só... – ele suspirou, balançando a cabeça. – Eu me sinto responsável. Sei que plantei muitas dúvidas sobre mim, sobre Ad...
Seraphine fez um aceno com a mão, dispensando-o de continuar.
– Vamos evitar falar disso por um tempo. Só enquanto eu arrumo meus pensamentos. Pode ser?
– Certo, desculpe. Eu me preocupo com você, com o que isso vai causar na sua cabeça a partir de agora.
Ela deu um risinho sem humor.
– Vai precisar usar suas habilidades com pessoas de verdade, não com a sua vizinha-cobaia.
– Ei, eu já fazia isso em Downville – ele se defendeu, marcando o livro com o dedo ao fechá-lo. Ian era acadêmico de Psicologia no último semestre. Estava indo para Green Valley cumprir estágio curricular. – E, além do mais, eu estive observando você.
– Você está sempre observando alguma coisa, Ian.
Ele levantou uma sobrancelha para ela.
– Vou desculpar a ironia porque sei que não tem dormido bem. Que interessante ver esse lado seu, Seraphine.
– Ah, se acostume, então. Já sou um objeto de estudo ainda mais interessante. Cheia de traumas novinhos em folhas, pesadelos sem explicação e alguns fantasmas me perseguindo – Ela afastou os cabelos do rosto e olhou para fora, pensativa.
Ian chamou-a e ela virou-se para ele novamente.
– Eu não me preocupo com você porque estou me formando em Psicologia. Eu me preocupo porque você é minha amiga. Lembra?
Ela tentou sorrir, mas teve quase certeza de que apenas um dos cantos de seus lábios se mexeu, o que podia ter produzido uma pequena careta.
– Não quis ser grosseira.
– Acredite ou não, essa é uma coisa que você não é – Ele deu uns tapinhas na mão dela que estava mais próxima dele, sobre o braço da poltrona.
– Eu vou organizar minha vida, vou tentar me estabelecer em Green Valley, colocar as coisas no lugar. E isso vai ser mais difícil se eu continuar vendo você...
– Tem certeza?
– Na verdade, não.
Eles riram brevemente. Seraphine sabia que não estava sendo totalmente sincera com ele. Após ter perscrutado o rosto de Ian por alguns segundos, procurava mágoa ou alguma decepção nos olhos dele, mas não encontrou nada disso. Deparou-se com uma grande compreensão: Ian podia entender muito bem as pessoas, quando queria. Ficava ali, escrito por todo o rosto dele. Aquela era talvez sua qualidade que mais a fazia querer continuar por perto.
– Tudo bem. Eu desisto. Vou precisar de alguém conhecido por aqui... Por que não você?
Ian sorriu travessamente, como uma criança a quem se promete um presente. Seraphine, porém, mal permitiu que ele revelasse o que havia por trás daquele sorriso.
– Mas... – Ela ergueu um dedo. – ...eu procuro você, está bem? Quando tiver me organizado melhor na cidade. Você vai estar no hospital, não vai?
– Sim. Vou estar em algum lugar da ala psiquiátrica.
– Ok. Hospital Central de Green Valley.
– Dica: fica no Centro.
– Ainda bem que você disse...
Eles riram.
– Estamos quase chegando à cidade. Em menos de uma hora – ele disse, por fim, parecendo muito contente consigo mesmo.
Ian não disse mais nada. Recostou-se na poltrona, colocando os óculos novamente para voltar à leitura. Seraphine respirou mais aliviada.
Isso acontecera já havia uma hora. Agora, recém-chegada de viagem, segurava entre os dedos um pedaço de papel amassado. Em uma caligrafia apressada estava apenas um número de telefone. Era de Ian. Ele havia deixado com ela e pedira que, assim que se sentisse à vontade, ligasse para marcarem um café ou algo do tipo na cidade. Como Seraphine havia trocado de número, por muitos motivos, dependia dela o encontro.
Por enquanto, aquela memória da última conversa antes de chegar à cidade rondava sua mente. Tinha coisas mais urgentes para resolver, como onde ficar e em que trabalhar, entretanto, por aquele momento, ainda que os acontecimentos que a levaram até Green Valley lhe causassem leves espasmos, deixou que aquela sensação de liberdade tomasse cada fibra de seu corpo até se permitir sorrir outra vez.
O recepcionista voltou e fora tomar seu posto no balcão, um senhor de cara fechada, o que era muito contraditório para um recepcionista. Mas ela aproximou-se. Os olhos sagazes do homem a fitaram de cima a baixo e pousaram na gaiola de Sammy.
– Não permitimos animais – ele disse seco.
– Como? – Seraphine sobressaltou-se.
– Não permitimos animais – ele repetiu mecanicamente.
– Bem, no anúncio de vocês não dizia isso... Olha, eu não vou ficar muito tempo, apenas uma noite e...
– Não podemos abrir uma exceção para a madame. Exceções geram reclamações neste ramo, caso você não saiba – O tom dele era ríspido e Seraphine estava perplexa.
– Eu posso falar com o gerente, então?
– A gerente não está no momento. E ela vai dizer a mesma coisa, já que são ordens da própria – Ele mal olhava para Seraphine, digitando no computador.
– Escute... É começo de noite, estou cansada. Vim de Downville, são sete horas de viagem.
– Devia ter feito uma reserva num hotel que aceite animais. Ou está vindo fugida de algum lugar e não pensou nisso? – Ele ergueu a sobrancelha para ela.
Ela franziu a testa, irritada.
– Não interessa como eu vim parar aqui – Decidiu ser rude também, já que ser educada não estava ajudando. – Se não pode receber meu gato que não dá trabalho nenhum no seu hotel, então não pode me receber também – Ela foi pegar as malas e a gaiola de Sammy, que fuzilava o recepcionista com os olhinhos âmbar brilhantes. – Tenho certeza que posso encontrar outro lugar com pessoas mais gentis que você e hotéis que sejam mais claros em seus anúncios. Tenha uma maravilhosa noite.
– Obrigado. Já você pode não ter a mesma sorte, não é mesmo? – ele ironizou e Seraphine ficou com ainda mais raiva.
Ela saiu, arrastando a mala, deparando-se com a enorme avenida à sua frente, apenas a rodoviária ao lado do hotel e um grande trecho de nada por alguns metros. Havia alguns postos de táxi, paradas de ônibus, mas nada parecido com um hotel ou pousada ali por perto. E estava anoitecendo depressa.
A raiva foi abrandando e ela se pegou pensando no que faria. Sammy miou baixinho na gaiola. Ela voltou para a rodoviária a passos largos, apressada. Deixou sua mala encostada em um banco em frente ao grande mural de informações e procurou algum anúncio de hotel mais próximo ao centro da cidade. Tinha um palpite de que devia começar por lá, afinal ainda não conhecia o lugar.
Foi quando puxou o celular do bolso que sentiu que ainda segurava o número de Ian na mão. Era isso: ele com certeza tinha dado passos mais precisos que o dela, já que estava praticamente instalado na cidade por causa do estágio. Ela digitou rapidamente os números e levou o aparelho ao ouvido. No segundo toque, desligou. “Não, nada disso!”, pensou. “Você se meteu nessa sozinha, agora vai sair sozinha!”. Era uma boa forma de começar na nova cidade. Do zero.
Ela suspirou, procurando o número de contato de algum lugar em que pudesse passar a noite. Tentou o primeiro que encontrou entre os diversos anúncios.
– Pousada Navarro, em que posso ajudar?
– Olá, boa noite. Eu gostaria de saber se há quartos disponíveis esta noite. E se vocês aceitam animais.
Houve um segundo de hesitação do outro lado.
– Há quartos disponíveis e aceitamos, sim, animais domésticos de pequeno porte. No entanto, eles ficam numa área reservada de nossas acomodações, não podem ficar no quarto.
– Entendo. É só por uma noite. Você pode me dar o endereço, então?
A recepcionista muito prestativa, ao contrário do anterior, deu o endereço e informou horários de funcionamento. Assim que Seraphine desligou, olhou em volta. Estava no meio da semana, começo de noite. Não havia muita gente chegando, então muitos táxis estavam disponíveis, em fila. Ela agradeceu aos céus. Alguma coisa tinha que dar certo.
Quase correu até o táxi sonhando com a perspectiva de deitar-se em uma cama confortável e finalmente descansar. Em poucos minutos, estava a caminho da pousada, com Sammy no banco de trás do veículo. Ele dera um pouco de trabalho para ficar lá, no entanto. Estava inquieto, talvez cansado de ficar na gaiola, mas Seraphine prometeu que lhe daria comida assim que chegassem à Pousada Navarro, o que pareceu acalmá-lo um pouco.
No banco do passageiro, Seraphine espiou de esguelha o taxista, um homem de meia-idade, boné vermelho e barba por fazer. Ele ia dizendo enquanto passavam por várias árvores ladeando a estrada:
– A Navarro fica no centro da cidade, são pelo menos vinte minutos até lá.
– Não tem problema. Só preciso de um lugar para ficar esta noite.
O taxista olhou pelo retrovisor.
– Tentou o hotel da rodoviária?
– Ah, tentei – ela enfatizou. – Lá não aceitam animais, o que é muito engraçado porque acho que fui atendida por um.
O taxista riu.
– Entendi... – Seraphine percebeu que ele a olhava pelo retrovisor. Sentiu um arrepio. – E você não é daqui, é?
Ela virou-se para ele, surpresa. Estava tão na cara assim?
– É que essa pousada é muito famosa na cidade. Dificilmente alguém não sabe onde é, a não ser que seja um turista... – ele explicou. Passaram em uma bifurcação.
Seraphine assentiu com a cabeça. Estava começando a ficar desconfortável, e decidiu não conversar mais. O taxista não persistiu na conversa, mas continuava observando Seraphine de canto de olho o tempo todo. Ela sentiu um ímpeto de descer, mas tinha a mala e Sammy no banco de trás também. Devia ter sentado lá, não no banco da frente. Estava tão terrivelmente cansada que mal conseguia pensar direito. Aquela avenida larga e fracamente iluminada por onde seguiam parecia não acabar nunca. A cidade parecia ainda a quilômetros de distância. Mas ela havia visto a placa quando chegaram a Green Valley. Estava tudo sob controle, em poucos minutos veria o movimento e as luzes da cidade.
E ela viu. Estavam ficando mais próximos da civilização. Havia lojas de departamento e restaurantes começando a aparecer. Estava absorta observando a fachada de um grande galpão isolado na penumbra, parecia saído de um conto de terror, encoberto pela escuridão, com um aspecto abandonado. Então o táxi começou a reduzir a velocidade. Estavam parando? Ela olhou ao redor e não havia nem sinal de hotel à vista.
Ela fechou os olhos e suspirou. Tinha algo errado. Seraphine apenas ouviu a voz grave ao seu lado:
– Nova na cidade, é?
Ela sentiu um arrepio percorrendo sua espinha e uma eletricidade espalhando-se por todo seu corpo. Medo, pânico e aflição, mas acima de tudo a certeza de que ela não iria ficar ali para saber o que aconteceria depois.
As mãos do homem já estavam agarrando o braço dela, mas Seraphine conseguiu desvencilhar-se e bater a mão dele na trava do cinto de segurança. Ele deu um urro de dor, mas em um único rompante de adrenalina, ela abriu a porta, com o homem inclinado por sobre o banco vindo para cima dela, tentando impedi-la de escapar. Seraphine puxou a mochila e bateu-a de encontro ao rosto do taxista, que ficou atordoado. Enquanto isso, ela empurrou a porta e sentiu o ar frio da noite lavar seu rosto que parecia em chamas, mas não se importou. Seraphine correu o mais rápido que já havia corrido em sua vida inteira.
Tudo passava por ela como enormes borrões coloridos, só se concentrou em mandar suas pernas correrem e não olhar para trás. Ela pensou ter ouvido o homem praguejando, mas a pancada no rosto devia ter atingido os olhos – havia alguns objetos duros no fundo da bolsa, o que podia ter potencializado o impacto. Ela agradeceu por isso, mas não parou de correr. As sapatilhas começavam a querer sair dos pés, entretanto, ela não parou.
O tempo inteiro em sua cabeça parecia ouvir o carro vindo atrás dela, mas ela já estava perto demais de um restaurante, ele provavelmente não ia se arriscar. As pernas começavam a fraquejar, mais por nervosismo, já que os anos sendo dançarina lhe deram alguma resistência. Seraphine não hesitou nem por um momento e só parou de correr quando atingiu a porta de vidro do lugar, empurrando com tanta força que quase não conseguiu se manter de pé quando pisou do outro lado.
Sua entrada desabalada fez todos que jantavam tranquilamente virarem as cabeças. Seraphine ficou ali, parada na entrada, vendo todos a observarem com surpresa e alguma desconfiança. A mochila atravessada nas costas de mau jeito, o rosto suado, devia estar muito vermelho, os cabelos desalinhados espalhados por todos os lados.
Uma garçonete na qual Seraphine não reparou muito bem se aproximou, e ela ouviu como um sussurro distante quando perguntou se Seraphine se sentia bem. Esta fez sinal de não com a cabeça, mal conseguindo respirar. A garçonete puxou uma cadeira de plástico, ajudando-a a sentar-se, e agora havia mais pessoas ao redor dela. A garçonete pedia que se afastassem um pouco e pediu a alguém que buscasse um copo com água e açúcar.
Seraphine começou a ouvir um zumbido ininterrupto, a vista estava embaçada. Ela engolia em seco, sem conseguir olhar diretamente para ninguém. Viu a mão com unhas pintadas de vermelho-vivo da garçonete segurando o copo à frente de seu rosto e Seraphine pegou-o avidamente. No primeiro gole, o estômago revirou, mas ela manteve-se firme, tentando respirar e fechando os olhos.
Quando se recompôs o suficiente para falar, a garçonete perguntou:
– O que houve? Assalto? Fizeram algo com você?
– Eu... – Ela soltou o ar com força. – Peguei um táxi na rodoviária. O homem devia ser... Ele ia fazer alguma coisa, mas eu consegui sair do carro. E vim correndo até aqui – soltou em um fôlego só.
– Nossa... Pelo menos está com sua mochila – A mulher observou, abaixando-se perto da cadeira para olhar melhor para Seraphine.
Então ela lembrou. Sammy. A mala. Todas as suas roupas e calçados estavam na mala. Na mochila pelo menos havia ficado o mais importante, mas Sammy... Seu gato. Deus, o pobre gato ia ficar perdido. Seu único companheiro por tanto tempo... Ela lembrou-se dos olhos âmbar de seu bichinho de estimação, todas as emoções que tinham se acumulado a sufocaram e foi impossível conter o choro.
Ela sentia a garçonete desconhecida segurando sua mão, sussurrando “Calma, querida!”, mas os últimos dias tinham sido os piores possíveis e quando ela pensou que as coisas iam finalmente melhorar, aqui estava ela, em um lugar estranho, chorando, em um restaurante de beira de estrada sem sua mala, sem seu gato, sem qualquer coisa.
Não adiantara nada, ela tinha obviamente feito uma besteira. No que ela estava pensando? Por que tinha achado que as coisas se resolveriam assim? Ela não tinha ideia do que estava fazendo. “Todos os lugares do mundo não são iguais a Downville, Seraphine. Você é uma burra, uma ingênua, por que não ligou para o Ian? Por que não foi com ele? Precisava fazer tudo sozinha? Para quem queria provar que era independente? Para quem queria provar que era bem-resolvida? Você é estúpida, Seraphine! Uma estúpida!”, ela gritava em sua mente. Então veio o remorso por tantas outras coisas engolfando seu coração com uma força que fazia seus ombros balançarem entre soluços. Ela queria chorar. Precisava chorar. E ali estava ela, derramando em lágrimas tudo que não conseguia dizer.
Aquela mão quente segurava a sua, era a única ligação com a realidade naquela primeira noite em Green Valley.
Seraphine estava se acalmando aos poucos. Havia afastado os cabelos longos do rosto, prendendo-os no topo da cabeça. Suas mãos ainda tremiam, mas pelo menos havia parado de chorar. Havia lavado o rosto, estava apenas levemente recomposta, mas sentia que ficava cada vez mais longe disso.
A garçonete gentil lhe oferecera mais água e ela aceitou de bom grado. As costas e as pernas formigavam e se sentara a uma das mesas. Um homem alto e corpulento, que ela soube depois ser o dono do restaurante, veio vê-la também, e estava parado ao lado delas, observando a situação. Ele disse, após alguns minutos:
– Garota, você precisa ir à polícia. Se quiser, podemos levá-la até o plantão mais próximo e quem sabe você tem suas coisas de volta... Havia objetos de valor com você?
Seraphine respirou fundo antes de responder:
– Todas as minhas roupas estavam na mala que eu deixei no táxi e... – Ela pensou em Sammy, o nó voltou a apertar em sua garganta. – ...meu gato de estimação.
O homem franziu a testa.
– Você estava viajando com todas as suas roupas? E um gato?
A garçonete suspirou:
– Emanuel, preste atenção. Talvez ela esteja de mudança. Não é isso... Qual é seu nome, afinal de contas?
– Seraphine – ela disse rapidamente, olhando o rosto da garçonete com mais clareza pela primeira vez desde que entrara.
A mulher ficou estática por alguns segundos. Depois balançou a cabeça.
– Não... – ela murmurou. – Ou será que...?
Seraphine sentia a cabeça rodar e ficou ainda mais confusa com a reação da garçonete. Estava difícil raciocinar.
– E você veio de onde? – ela prosseguiu.
– Downville. E, sim, eu estou de mudança.
– E caiu no truque de um espertinho desses de beira de estrada... Que lástima! – Emanuel disse, dando um tapinha nas costas de Seraphine.
No entanto, a garçonete continuava pensativa. Até que ela saltitou na cadeira, fazendo os outros dois olharem para ela ao mesmo tempo.
– Espere – ela disse. – Você por acaso morou na Casa Reynolds?
O nome fez um estalo na mente de Seraphine. Mas foi distante, como uma coisa que com certeza ela tinha de se lembrar. Observou o rosto redondo da garçonete, os olhos azuis, os cabelos tingidos de vermelho... Algo era familiar.
– Meu Deus! – a ruiva exclamou. – Você é A Seraphine.
Será que a garçonete a conhecia do La Lune? Devia ser isso. Provavelmente era isso. Mas ela havia mencionado o orfanato. Seraphine balançou a cabeça.
– Qual o seu nome? – perguntou.
– Joanna, hoje só Jo. Mas quando nos conhecemos, me chamavam mais de Joanna.
Joanna. O nome ganhou vida em sua mente. A garota que havia sido adotada logo antes dela, a sorridente, alegre e loira Joanna... Que também tinha ido para a França. Seria a mesma garota de sua infância?
Joanna, ou Jo, levou a mão à boca, consternada, mas sorria por entre os dedos.
– Eu não acredito! Eu sabia que algo de especial ia acontecer hoje, é claro. Sempre leio o horóscopo antes de sair de casa. Mas isto? Eu nunca ia imaginar! Seraphine!
– Jo... anna? – Seraphine enunciou, em choque. – O que você... Como...?
Ela riu, tão confusa quanto Seraphine.
– Eu sei! Nossa, que loucura!
– Vocês se conhecem, então? – o tal Emanuel perguntou.
– Sim! Fomos colegas de escola, vivemos juntas por anos no mesmo lugar... – ela desconversou, talvez não quisesse falar do orfanato. – E agora foi o destino que a trouxe justamente até aqui... Bom, em circunstâncias horríveis, mas ainda assim... – Voltou a balançar a cabeça. – Que loucura!
Seraphine conseguiu dar um sorrisinho, mas Joanna levantou-se e parecia tomada por um ânimo novo.
– Emanuel, você me dispensa do resto do turno de hoje? Devia sair às oito, faltam só trinta minutos agora... Quero levar a Seraphine até a delegacia, depois vou levá-la para minha casa. Não posso deixar alguém que fez parte da minha vida por tanto tempo sozinha nesta cidade – ela falava rápido, fazendo Emanuel rir um pouco. Ele a dispensou com uma mão.
– Vá, a garota precisa de um rosto conhecido. Olhe o estado dela... – Ele sacudiu a cabeça. – Vou pedir para prepararem uma refeição quente para vocês levarem.
– Nós vamos denunciar esse babaca, pode ter certeza. Seria bom se tivéssemos o número da placa, mas acho que podemos conseguir com o pessoal da rodoviária... Eu acho – Jo ficou pensativa. – Espere aqui.
Seraphine só conseguia assentir com a cabeça, surpresa demais para conseguir falar. Sua cabeça girava em um turbilhão, mas no fundo, sabia que devia ficar feliz. Não estava sozinha, afinal.
Joanna estava firme em encrencar o máximo que pudesse o homem que havia feito aquilo com Seraphine. Elas voltaram até a rodoviária, o que fez o estômago de Seraphine despencar, mas as duas foram até o balcão de informações e Joanna foi perguntando tudo que podia sobre o homem que Seraphine havia descrito. Todos na rodoviária pareciam muito confusos, pois todos os táxis credenciados tinham registro ali e não havia nenhuma saída registrada no horário que Seraphine mencionou. Ninguém por ali soube dizer com certeza quem era o taxista. Aparentemente, era algum bandido disfarçado que conseguira pegar um táxi em algum lugar. Os funcionários da rodoviária ficaram de sobreaviso.
Em seguida, as duas seguiram no Chery laranja de Jo. Era um carro minúsculo, compacto, mas estava cheio de adesivos apoiando as mais diversas causas. Sentada no banco do carona, Seraphine observou que havia uma cruz de acrílico colorido pendurada no retrovisor, junto com uma pequena imagem de Buda. Jo era no mínimo peculiar.
Ela soltara os cabelos curtos antes presos por uma redinha e os olhos azuis eram muito vivos, atentos na estrada. Pediu que Seraphine avisasse quando passassem pelo local onde tudo tinha acontecido. Quando passaram alguns metros depois da bifurcação que Seraphine conseguira se lembrar, ela disse:
– Aqui, foi aqui.
Jo parou no acostamento e Seraphine estava ainda muito assustada. Quase pediu para ela não descer do carro, mas já tinha feito isso e estava parada ao lado da avenida. Não havia mais nenhum táxi ali, nem tampouco os pertences perdidos.
– Vamos logo à delegacia, talvez eles venham procurar ainda hoje ou amanhã pelas redondezas...
Seraphine suspirou. Sentia-se cada vez mais cansada. O coração palpitava, ela só conseguia pensar no que poderia ter acontecido se ela não tivesse reagido por instinto... E, acima de tudo, pensava em Sammy. A criaturinha da qual cuidara por tanto tempo e agora falhara em proteger. Parecia infantil se importar tanto com um gato, mas era cruel que ele estivesse sozinho agora. Torceu para que ele tivesse saído daquela estúpida gaiola de alguma forma, arranhado todo o rosto do homem e fugido. Ele se viraria bem, vivia na rua até Seraphine adotá-lo, saberia como sobreviver.
Ela reconfortou-se com esse pensamento, mas seu coração estava pesado.
Jo parou no posto da polícia a pelo menos cem metros do “Tempero da Casa – Restaurante e Lanchonete”. Era uma espécie de casa pintada de azul e branco, e não devia ter muitos policiais ali dentro. No entanto, elas desceram, Seraphine incapaz de tirar a mochila das costas por um segundo que fosse.
– Boa noite! – Jo saudou, sacudindo a chave do carro. – O delegado Martinez está de plantão? – ela perguntou à moça muito jovem na entrada.
A jovem virou algumas folhas em uma agenda e respondeu:
– Ah, sim, sim. Ele acabou de chegar.
– Ótimo! – Jo foi entrando, muito íntima do lugar. Seraphine apenas acompanhou-a, esperando.
Quando passaram do portal de entrada, elas viram um homem na faixa dos quarenta anos, de pele avermelhada, porém muito atraente e com uma pose de policial de filme americano. Ele devia ser o tal Martinez. Jo sorriu e estendeu a mão para ele.
– Oi, Hugo! – saudou, sentando-se na cadeira à frente da mesa dele, cruzando as pernas. – Sente-se, Seraphine. Este é meu amigo, Hugo Martinez.
O policial estendeu a mão para saudar Seraphine também, menos efusivamente.
– Então, a minha amiga aqui acabou de passar maus bocados e queríamos fazer um boletim de ocorrência contra o tarado que estragou a imagem da nossa cidade para ela – Jo disse.
O delegado virou os olhos castanhos e profundos para Seraphine. Eram olhos frios, que já haviam visto de tudo. Estudou-a por um momento até puxar uma ficha da gaveta e começar a tomar nota.
Seraphine descreveu tudo como aconteceu e Jo ajudou-a a complementar o que esquecia. Falaram desde o carro até os objetos de Seraphine e, por fim, do gato, o que fez Martinez franzir a testa. Quando acabaram, com os olhos ainda no papel, ele disse:
– É, um caso atípico. Mas vamos averiguar... Não há garantia de que você vai ter suas roupas e seu gato de volta, mas esse sujeito... Não costuma haver esse tipo de ocorrência na rodoviária. Vou mandar os rapazes até a área, talvez ele tenha se desfeito de algo no meio daquele monte de árvores, ou largado o táxi em algum lugar... Bem, nunca se sabe – Ele fitou Seraphine longamente. – Está chegando agora, mas tenha cuidado. Downville é uma cidade tranquila até demais. Não podemos dizer o mesmo de Green Valley.
Jo revirou os olhos.
– Corte o drama, Hugo. Ela está comigo agora, o que quer dizer que está em boas mãos.
– Ótimas mãos – Ele sorriu, o que lhe deu um ar ainda mais sedutor.
Jo sorriu abertamente para ele.
– Bem, o que faremos agora? Retrato falado? – ela prosseguiu, inclinando-se sobre a mesa e apoiando o queixo nas mãos, como uma garotinha.
– Precisamente. Vou chamar o retratista, ele foi jantar, mas já deve estar de volta.
– O Dan? – Jo perguntou. – Há muito tempo. Saiu lá do restaurante tem mais de uma hora.
Martinez balançou a cabeça, levantando-se e colocando a cabeça no cômodo ao lado. Chamou por Dan, e em segundos entrava um rapaz de no máximo trinta anos, ruivo e com algumas sardas pontilhando o nariz. Usava óculos enormes de aros pretos e já tinha um bloco de papel e um lápis na mão.
– Nosso retratista, Daniel – Martinez apresentou.
– Olá, Daniel! – Seraphine disse, acenando, tímida.
Ele sorriu para as duas.
– Me apresente sua amiga, Jo.
– Esta é a Seraphine, e não é para o seu bico – Todos riram, Seraphine um pouco mais, de nervosa. – Temos um retrato falado para fazer e seja rápido, estou morrendo de fome!
Seraphine sentou-se na mesa ao lado, de frente para Dan, que inesperadamente assumiu uma postura profissional, puxando os óculos para a ponta do nariz.
– Diga-me tudo, não esconda nada – ele brincou, vendo o nervosismo de Seraphine. – Sério, não deixe de lado nenhum detalhe que você se lembrar. Computadores fazem o serviço, mas não tão bem quanto o papai aqui.
Ela assentiu com a cabeça. Falou que mal tinha visto direito o rosto dele, já que na penumbra do táxi era difícil, mas se lembrava que era caucasiano, usava um boné vermelho e o cabelo por baixo parecia liso, mas bem curto e escuro. Era grande, o corpo largo, os olhos escuros, mas não se lembrava do nariz, nem da boca. Entretanto, tinha barba e usava uma camisa branca.
Daniel ia desenhando, concentrado, com Jo de pé às costas dele. Quando ele terminou, ela comentou:
– Nossa, que nojento.
– Demais! – Seraphine enfatizou, concordando.
– Bem, é isso. Vamos digitalizar, fazer alguns cartazes e começar as buscas. Espero que fique bem, Seraphine. Bem-vinda a Green Valley, de qualquer forma – Martinez desejou, apertando sua mão novamente.
Seraphine agradeceu e colocou sua cópia do boletim na mochila. Era levemente decepcionante não ter muitas garantias de que algo de fato seria feito quanto ao homem que levara tudo que ela tinha. Mas já tinha sido bom o suficiente encontrar Joanna. Seraphine a observava da porta, esperando, enquanto ela conversava com Dan e Hugo. Nunca, em mil vidas, adivinharia que ainda veria outra vez alguém da época do orfanato e em uma situação tão adversa. Ainda se perguntava se fizera a escolha certa vindo para Green Valley, sentia uma enorme dor no peito pelo susto e pela perda de Sammy, mas ainda assim sobrava um pouco de esperança na caixa de Pandora.
Jo encontrou os olhos de Seraphine do outro lado da sala e sorriu. Foi inevitável sorrir de volta.
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